Criado Fórum Maranhense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos
Por iniciativa do Ministério Público do Maranhão, em parceria com entidades da sociedade civil e instituições governamentais, foi criado na última quinta-feira, 21, o Fórum Maranhense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos. O colegiado foi instituído, por aclamação, em audiência pública realizada no Centro Cultural do MPMA, em São Luís. O objetivo é promover, no âmbito estadual, ações integradas de defesa do meio ambiente e da saúde da população pelos males causados pelos defensivos agrícolas.
No Maranhão, foram identificadas 211 comunidades tradicionais e assentamentos rurais, em 33 cidades, prejudicados pela pulverização de agrotóxicos. O uso indiscriminado ameaça a vida de pessoas e animais, compromete a biodiversidade, a segurança alimentar e nutricional da população desses municípios.
O titular da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de São Luís, Cláudio Rebêlo, destacou que o fórum maranhense é o 34º criado nestes moldes, no Brasil, dentre fóruns regionais e estaduais. “Não se trata de proibir o uso de agrotóxicos, pois existe uma legislação extremamente permissiva. O Brasil é um dos países que mais permite o uso, tanto na quantidade, quanto nos tipos e espécies. Queremos que esse uso seja realizado da forma correta”.
A procuradora do Trabalho Anya Gadelha, representante do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, destacou que as consequências atingem a população em geral, mas são maiores nos trabalhadores. “Eles são expostos à contaminação e existem estudos comprovando o aumento do risco de câncer”.
Em seguida, o titular da 1ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Luís Fernando Cabral Barreto Júnior, agradeceu os presentes na audiência pela luta em defesa da biodiversidade e combate aos abusos do agronegócio. “O ideal seria um mundo sem agrotóxico, mas nós não temos esse mundo ainda. Mas mesmo nesse mundo existem limites, muitas vezes não respeitados. A dispersão da embalagem de agrotóxico, a reutilização, a entrega a terceiros, tudo isso são problemas que vão afetando os trabalhadores rurais”, pontuou.
Por meio de videoconferência, o procurador Regional do Trabalho de Pernambuco e coordenador do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos, Pedro Serafim, ressaltou a articulação maranhense. “O Fórum Nacional, agora com o Maranhão, terá 34 fóruns sobre a temática. Todos devemos atuar com equilíbrio, buscando as melhores soluções para que favoreçam a saúde, o meio ambiente, a economia, enfim, a sustentabilidade”.
O uso de agrotóxicos no território brasileiro cresceu 236% entre os anos de 2000 e 2007, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (ONU). Em 2008, o Brasil passou a ocupar o primeiro lugar mundial em consumo de agrotóxicos, inclusive daqueles proibidos na União Europeia e nos Estados Unidos. Os produtos são nocivos para as pessoas, animais e contamina as fontes de água.
PARTICIPAÇÕES
Cidivânia Andrade, da Associação Agroecológica Tijupá, uma das organizações que integram a Rede de Agroecologia do Maranhão, afirmou que as organizações recebem pedidos de socorro daqueles que não são vistos. “A gente tem relatos e vídeos com pedidos de socorro de muitas comunidades e agricultores que, infelizmente, em plena pandemia, foram amplamente impactados pela pulverização aérea de agrotóxicos. Não só a contaminação física dos agricultores, mas também a contaminação dos seus alimentos, afetando sua soberania e segurança alimentar e nutricional”.
A professora do Instituto Federal do Maranhão (Ifma) e integrante do Núcleo de Estudos em Agroecologia Djanira Rubim, campus Monte Castelo – São Luís, informou que são realizadas pesquisas desde 2013 sobre a contaminação advinda dos agrotóxicos. “Fazemos análises destes pesticidas e percebemos que não apenas os alimentos, mas as águas estão contaminadas e isso é preocupante”, alertou.
A filha de camponeses Kátia Gomes de Sousa, do assentamento Califórnia, em Açailândia, narrou as consequências negativas dos defensivos agrícolas. “Somos impactados até hoje pelos agrotóxicos. A gente mora em um espaço cercado pela monocultura do eucalipto e sofremos com a pulverização dos agrotóxicos, contaminação do solo, da água, das pessoas. Hoje temos casos de pessoas em nosso assentamento que estão morrendo de câncer”.
O líder comunitário Valdivino Silva é do território quilombola São Benedito dos Colocados, em Codó. “Nós estamos discutindo aqui mecanismos que possam nos ajudar a nos defender da morte dos venenos. Eu sou de um território quilombola que já está cercado pelas grandes monoculturas e pelo avanço do agronegócio que só pensa em lucro. Não se pensa em gente de jeito nenhum. Só se lembram do dólar. Muitas vezes nossos governos são culpados porque não olham para o povo pobre como gente”, desabafou.
O quilombola afirmou que a pulverização gera a poluição do ar, das fontes de água, das florestas e dos babaçuais. “Lá no meu território, onde eu moro, o avião começa a passar no dia 25 de janeiro e continua até 6 de fevereiro para pôr veneno e contamina o riacho que recebe outras águas e isso mata peixe, mata gente, mata caça e causa o maior racismo ambiental naquela região, que é a destruição total e em massa do bioma Cerrado”.
Para a secretária-executiva da Rede de Agroecologia do Maranhão (Rama), Ariana Gomes, o monitoramento realizado pela instituição nas comunidades, a partir das informações repassadas por suas lideranças, confirma o racismo ambiental e o ataque à população pobre em todo o estado. “É um processo gigantesco de violação dos direitos humanos que essas comunidades têm enfrentado. Esse fórum tem um papel primordial de fazer esse enfrentamento e monitoramento das comunidades para combater esses agrotóxicos”.
A contaminação das fontes de água e o impacto na sobrevivência das comunidades tradicionais também atinge os territórios indígenas. O coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no Maranhão, Gilderlan Rodrigues, afirmou que a instituição constatou o aumento dos conflitos pelo avanço da monocultura da soja. “As terras indígenas estão sofrendo um grande impacto por conta dos agrotóxicos porque são grandes áreas pulverizadas e acabam atingindo os rios, principalmente rio Corda e o Mearim. Grandes empresas são responsáveis por essa disseminação de agrotóxicos, tanto pela devastação do Cerrado como pela pulverização de venenos nos rios utilizados pelos indígenas”.
Representantes de instituições públicas e associações comunitárias de diversas cidades maranhenses se manifestaram na audiência pública e igualmente apresentaram demandas relacionadas à preservação ambiental e denunciaram ataques feitos aos pequenos agricultores, pescadores e às comunidades tradicionais.
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